terça-feira, 27 de novembro de 2007

Lições de Gramsci e Lênin


A esquerda brasileira mistura recomendações de Gramsci e de Lenin nos seus métodos de ação. De Gramsci, ela adquiriu a técnica de firmar posições estratégicas em setores econômicos e sociais relevantes. Gramsci considerava-as uma espécie de catapulta para chegar ao socialismo pacificamente. E, desde a posse do presidente Lula, o núcleo mais à esquerda do PT vem trabalhando duro para lotar com gente sua, ou influenciar indiretamente, cargos e pessoas importantes de sindicatos, estatais, ONGs, partidos políticos, universidades, meios de comunicação, Igreja e outros que ajudem de alguma forma a alcançar o socialismo. Irrelevante se, segundo estudo da cientista política Maria Celina dAraújo, a maioria dos indicados para os cargos públicos não tenham preparo técnico para desempenhá-los. Ou que o orçamento de 2008 contemple 56.348 novas contratações pelo governo federal (29 mil derivadas de cargos a serem criados), que vão elevar os gastos de pessoal da União de R$ 118,1 bilhões em 2007 para R$ 130,8 bilhões em 2008. Os fins justificam os meios.

De Lenin, tomou a retórica discursiva, condensada em sua famosa máxima: "Primeiro, confundam o vocabulário". O presidente Lula, considerado por alguns como de "aguçado faro político", valendo-se do baixo nível de informação dos brasileiros, é useiro e vezeiro na prática leninista. Há poucos dias, diante de um grande público, disse que "pobre não paga CPMF". Levaria a maior vaia se falasse num país bem informado. Mas no Brasil teve mais aplausos do que vaias. Noutra ocasião, querendo Hugo Chávez no Mercosul, sustentou: "A Venezuela é uma democracia"...

Mas os métodos leninistas não são privilégio do presidente Lula. Eles também vêm sendo usados pelo governo gaúcho. O plano que previa aumento do ICMS foi chamado por seus criadores de "Plano de Recuperação". Mas é um termo desvirtuado economicamente. Há um farto material teórico, apoiado por inúmeros exemplos empíricos, que mostra, categoricamente, que no atual nível da carga tributária um aumento do ICMS vai desequilibrar ainda mais no médio prazo as finanças do Estado e não "recuperá-las". Confundindo ainda mais as palavras e o conceito econômico, os criadores do "pacote" argumentaram que: "O Estado... confere à população gaúcha um dos melhores padrões de vida do país". A argumentação - falsa em se tratando de governo! - foi para concluir que se precisava do aumento dos impostos para "a sociedade gaúcha não perder qualidade de vida e competitividade". São considerações que ruborizariam o próprio Lenin: esse autor queria acabar com os impostos indiretos, tipo ICMS, justamente para acelerar o desenvolvimento e, acreditem, "dar mais qualidade de vida aos pobres" (Pravda, 7 de junho de 1913).

ALFREDO MARCOLIN PERINGER Economista

Zero Hora, 27 de novembro de 2007 N° 15431

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Democracia, o Deus que falhou?

São poucos os que se atrevem a falar mal das "democracias" representativas, por considerá-las justas, progressistas e propícias à prática da liberdade. Mas Rose Wilder Lane, no seu The Discovery of Freedom, tem opinião contrária. A autora afirma que as democracias representativas são o fulcro do socialismo, na teoria e na prática. O primeiro impulso de quem lê o livro é o de considerar a afirmação falsa. Ao aprofundar, porém, os estudos sobre prognóstico tão catastrófico para a humanidade, verá que James Madison é mais pessimista ainda com os sistemas democráticos, a ponto de prever o fim deles já a partir do final do século 20.

Afinal, o assunto intriga, pois a afirmação parte do "pai" da Constituição americana e presidente dos EUA por dois mandatos. As loucuras de Hugo Chávez na Venezuela com seu projeto totalitário e seu interesse em espalhá-lo aos países da América Latina, Brasil inclusive, põem mais lenha na fogueira.

As defesas do leitor esmorecerão ao notar que a predição de Madison não está solidificada só em comparações empíricas, como na força da razão, as democracias: a) não conseguem proteger a liberdade e a propriedade privada; b) beneficiam a maioria, em detrimento da minoria (classe média), através de leis expropriativas; c) não são governadas pela maioria, mas por um punhado de representantes que visam, acima de tudo, ao interesse próprio; d) estimulam uma visão de curto prazo, propícia à malversação dos recursos e à formação de corruptos e tiranos ("nas monarquias", diz, "tende a preponderar uma visão de longo prazo, necessária para manter o patrimônio aos sucessores").

Tenderá a aceitar o presságio quando ler o livro Democracy, the God that Failed, de Hans-Hermann Hoppe. É o mais bem estruturado trabalho contra as democracias representativas no mundo, fundamentado no axioma da ação, estudo da praxeologia, ciência das leis sociais. Por esse estudo, Hoppe sustenta que as democracias levam inexoravelmente ao aumento dos gastos, do endividamento e do intervencionismo governamentais e, logo, ao esgotamento econômico e desemprego. De fato, no início desses sistemas os gastos governamentais andavam ao redor de 5% do PIB, o endividamento público era relativamente baixo e as atividades do governo atinham-se à proteção da vida, da liberdade e da propriedade dos cidadãos.

Ao referir-se à grande aceitação desse tipo de sistema governamental, Lane e Madison responsabilizam o mito social de que "sem democracia não há liberdade". Contrariamente, sustentam que, para preservar a liberdade, precisa-se abandonar a democracia em favor dos regimes monárquicos. Diante da crença social de que nas "democracias as decisões vêm de Deus", Hoppe sustenta que a máxima é sacrílega, pois, segundo ele: "A democracia é um deus que falhou"...

ALFREDO MARCOLIN PERINGER/ Economista
Zero Hora, 06/9/07

terça-feira, 7 de agosto de 2007

A economia e os seus muitos donos

O desabafo metafórico do presidente Lula, de que "cachorro que tem muitos donos, morre de fome: ninguém cuida", tem um fundo de verdade científico, quando aplicado à economia. Trata-se da base filosófica do economista escocês Adam Smith, quando diz que é o dono quem, movido apenas pelo próprio interesse, promove o crescimento do seu negócio e, conseqüentemente, da economia. Ela não é diferente, também, do velho brocardo que nos ensina que "é o olho do dono que engorda o porco".

Mas, cientificamente, coube a Ludwig Von Mises, economista da escola austríaca, baseado na ciência praxiológica, fundamentar que a administração privada, com um único dono, é mais eficaz do que a administração pública, em que os interesses são diluídos entre muitos donos e mostrar, nas suas obras, que o número maior de donos gera desperdícios em termos de renda, salários e juros para a população. De fato, com relação aos juros, estudo da Febraban mostra que são altos porque há mais "depósitos compulsórios do sistema financeiro no Banco Central do que em crédito rural e habitacional, juntos". Aliás, eles superam o volume do crédito concedido à própria indústria, devido às altas taxas dos depósitos compulsórios nessa instituição financeira (45% sobre os depósitos à vista e 8% sobre os depósitos a prazo). Por esdrúxulo que pareça, mesmo que: a) os lucros bancários e a taxa Selic fossem de zero por cento; b) fosse eliminado o risco da inadimplência (inadimplência zero!) e; c) as instituições bancárias operassem sem custos, ainda assim as taxas de juros que os bancos cobrariam do tomador de crédito não poderiam ser inferiores a 29,4% ao ano. A exorbitante carga tributária vigente no país e o cipoal de impostos e taxas respondem pela diferença, com destaque para o PIS, Cofins, IOF, CSLL, ICMS, ISS, CPMF, IR, compulsório e outros ônus sociais.

Enquanto isso, os defensores do famigerado estatismo econômico culpam a economia de mercado pelas mazelas do país, argumentando maliciosa e equivocadamente, sem nenhuma base científica, que os problemas econômicos, a exemplo do desemprego (o dos jovens anda ao redor de 50% da PEA), que vivemos num sistema capitalista. Grande falácia. Como chamar de capitalista um País em que o governo apropria-se de cerca de 40% do PIB e controla mais de 80% do volume do crédito (de cada R$ 1,00 em depósitos à vista, um banco só consegue emprestar R$ 0,20)? Ademais, a oferta de títulos da dívida pública, hoje beirando os R$ 1,1 trilhão (deve fechar o ano próxima de 45% do PIB) faz uma competição deletéria à iniciativa privada.
Concordamos com o desabafo presidencial. Mas o que precisamos é de ação para reduzir o número de donos dos nossos recursos, numa guinada do estatismo açambarcador para uma genuína economia de mercado.

ALFREDO MARCOLIN PERINGER/ Economista
Zero Hora, 07 de agosto de 2007. Edição nº 15326