por Alfredo Marcolin Peringer*
Os rumores no País são de que o Ministro da Fazenda Guido Mantega só fica no governo se conseguir controlar a inflação. Para se resguardar, Mantega eximiu-se de responsabilidade, transferindo o ônus para um pseudo “surto inflacionário mundial”. Mas não ficou só nisso. Responsabilizou também toda a sociedade brasileira, ao afirmar: “o país está preparado para controlar a ‘alta de preços’”. Já conhecemos esses ardis político-mercadológicos. Quer desviar a atenção da moeda, causadora da inflação, acusando os “preços”. Seria a reedição da famosa turma dos “Fiscais do Sarney”. Mesmo que se advirta o Ministro de que a inflação é um problema eminentemente monetário, como um desenvolvimentista confesso, não deverá corrigir o rumo. É bem conhecida a deficiência de saber dos meandros monetários do ministro. Acha que pode haver crescimento econômico via inflação monetária, ignorando que não se trata de uma evolução sustentada, mas de um inchaço, que logo redunda em queda da atividade econômica e em desemprego. Temos que contar com o entendimento dos demais consultores da Presidenta de que os "preços" são consequência da má gestão da moeda pelo Banco Central, instituição, no caso, subordinada ao Ministério da Fazenda.
O fato é que a quantidade de moeda existente na economia pode (e deve) ser controlada pelos saldos da Base Monetária, agregado composto, em nosso país, pela moeda emitida e pelas reservas bancárias sob a guarda da autoridade monetária. A título de ilustração, em março de 2011, o valor da base era de R$ 180,8 bilhões (média dos saltos diários), valor esse R$ 22,1 bilhões superior ao de março de 2010, experimentando acréscimo de 13,9%. Vários fatores contribuíram para essa expressiva alta, mas os principais foram as operações com títulos públicos federais, no montante de R$ 126,8 bilhões no período, seguidas pelas operações do setor externo, no valor de R$ 110,0 bilhões, entre outras de menor expressão. Pelo lado da redução da base, estão os volumes de depósitos de instituições financeiras, no valor de R$ 157,3 bilhões e as operações do Tesouro Nacional, equivalentes a R$ 52,3 bilhões.
A análise dessa evolução mostra um fato marcante do período: a total atipicidade dos condicionantes da base monetária. Talvez por se tratar de ano eleitoral, o setor externo foi o único a mostrar variações normais. O alto ingresso de divisas, trocadas por moeda nacional, vão alimentar a alta da liquidez. Mas intriga que, no intervalo em análise, o banco central não haja usado, no global, a venda de títulos públicos federais para enxugar esse expressivo volume de dinheiro externo (R$110 bi). Ao contrário, as operações com títulos públicos federais inflaram ainda mais a base, onde algumas operações conspiram contra a lógica do sistema, a exemplo da compra, no mercado secundário, de R$ 119,7 bilhões de títulos públicos federais em apenas um único mês (dezembro/10), responsável por cerca de 95% do total dos doze meses dessas operações. Fica-se também perplexo com o registro de três depósitos de instituições financeiras, no montante de R$ 157,3, também fora dos padrões normais dessa conta, mas cuja ausência poderia permitir um verdadeiro tsunami de liquidez na economia brasileira, dado o alto giro da base, ao redor de 19 vezes anuais.
Tantas atipicidades nos levam a questionar algumas dessas operações, indagando se não são meras artimanhas contábeis, feitas a título de window-dressing, apenas para encobrir o excesso de liquidez na economia brasileira e permitir, dadas as convicções desenvolvimentistas do Ministro Mantega, um maior “crescimento” econômico. Tudo é possível! Mas a hipótese é branda, ainda que perversa economicamente, em relação à má gestão monetária global e ao mau gerenciamento dos juros no período. Afinal, as altas taxas de juros no Brasil são mantidas para facilitar o enxugamento monetário, através da venda dos títulos públicos federais, e permitir controlar, com isso, a inflação. Mas, paradoxalmente, o período foi de compra líquida desses títulos, configurando-se numa situação em que foram mantidas altas taxas de juros, não para vender, mas para comprar títulos públicos federais. As operações não apenas inflaram ainda mais a liquidez do mercado, como as despesas com a conta de juros, podendo alcançar algo em torno de R$ 190 bilhões anuais, altíssima para os padrões pobres da nossa economia.
A ênfase é a de que a gestão monetária pode ser feita de maneiras distintas, inclusive com a gestão direta da própria moeda. Os juros, por ser um fenômeno real, e por ser feito de maneira indireta, são os menos recomendáveis. Erra quem ignorar os simples mandamentos da teoria quantitativa da moeda que, em suma, afirmam: manter o crescimento monetário ao redor do crescimento do PIB. Os empregos do Ministro Mantega e do Presidente do banco central podem ser mantidos se eles seguirem esses mandamentos, pois não ocorrerá inflação!
* Economista
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