terça-feira, 12 de outubro de 2010

O populismo vs o socialismo bolivariano

por Alfredo Marcolin Peringer*

Causou impacto há algumas semanas as declarações de Fidel Castro a Jeffrey Goldberg, jornalista americano, de que o modelo socialista cubano não funciona sequer para Cuba. Ainda que Fidel, diante da repercussão política negativa, haja levado para o terreno do mal entendido, Goldberg foi implacável, ironizando que a expressão “o modelo cubano não funciona sequer para nós mesmos”, significa “o modelo cubano não funciona sequer para nós mesmos".

Mas o desabafo de Fidel não deve causar espanto. Gorbachev já fez o mesmo com relação à União Soviética. Só que, infelizmente, não conseguiu apoio do Politburo para flexibilizar a economia. Deng Xiaoping foi mais feliz. Desde 1978, quando a China iniciou as reformas na direção do “socialismo de mercado”, o País não parou mais de crescer e o povo de melhorar de vida. O PIB, ainda que não seja um índice adequado, dá uma noção desse crescimento: saiu de US$ 202 bilhões em 1980, para US$ 4,9 trilhões em 2009 (FMI) e os índices de pobreza caíram de 53% para menos de 8% no período, números que sugerem a correção da medida (Martin Ravallion and Shaohua Chen, “China’s Progress Against Poverty”, Policy Research Paper 3408, Development Research Group, Washington D. C).

Francis Fukuyama, ao analisar as mudanças, pode até achar que estava certo ao prognosticar, na obra "O Fim da História", o término dos regimes socialistas totalitários. Mas não. Paradoxalmente, outros países vêm fazendo o caminho inverso, reduzindo as relações econômicas dentro do mercado e aumentando as do Estado. O caso brasileiro é emblemático. Tomando a carga tributária como representativa do tamanho governamental, ela passou de cerca de 20% do PIB em 1980, para algo em torno de 40% em 2009*. Inevitavelmente, a apropriação cada vez maior da poupança privada pelo setor público estancou o crescimento brasileiro. Adotando-se novamente o PIB como referência, nota-se que ele passou de US$235 bilhões em 1980 (inicialmente maior do que o da China!), para US$ 1,57 trilhão em 2009, ou menos de um terço do PIB chinês. (* Obs.: percentual ajustado para incluir as alterações da base de cálculo do PIB feitas pelo IBGE).

Se os políticos brasileiros não aprendem com a história, têm que aprender com a teoria. E Ludwig Von Mises é uma boa fonte. Mostra, de forma axiomática, que o socialismo é ineficiente na geração de renda e empregos, devido à impossibilidade de realização do cálculo econômico. Em outras palavras, a alocação dos bens de capital, feita por meios burocráticos, não tem a mesma eficácia da feita pelo sistema de preços, gerando pobreza relativa, perda da liberdade e excesso de opressão, ao menos para os não alinhados ao sistema (vide ‘Socialism, an Economic and Sociological Analysis’).

Felizmente, para o povo cubano, os irmãos Castro dão indícios de que, ao menos, darão uma guinada na direção da economia de mercado, ao noticiar recentemente que estimularão a iniciativa privada para absorver os cerca de 500 mil servidores públicos que pretendem demitir até o fim do primeiro trimestre de 2011. Ao menos, porque ainda ficam faltando as reformas democráticas.

Mas, enquanto isso, aqui no Brasil, o quadro continua na direção inversa. O governo atual loteou, desde que assumiu, todos os espaços da máquina pública do País com seus correligionários. E o futuro governo, avaliado pelo currículo das duas pessoas que concorrem para sucedê-lo, nos deixa uma expectativa tão ou mais negativa do que a atual: uma delas é simpatizante confessa do populismo, e a outra, pior ainda, é uma forte defensora do “socialismo bolivariano”...

Deus nos proteja!

http://www.professorperinger.blogspot.com/
*ECONOMISTA

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

A difícil evolução das ciências humanas,

por Alfredo Marcolin Peringer*

Raul Seixas era um artista que cantava o lúdico, o romântico e o poético, mas, também, o lado prático da vida. Algumas músicas dele extasiam, inclusive, pelo bom teor filosófico, como no caso de “As Aventuras na Cidade de Thor”, onde recita: "Tem gente que passa a vida inteira/Travando a inútil luta com os galhos/Sem saber que é lá no tronco/Que tá o coringa do baralho”. Refere-se às lutas equivocadas, praticados pelos homens, em todos os campos. Aliás, quanto mais letrados, mais graves tendem a ser os erros. Einstein dizia que “o progresso científico é como um machado nas mãos de um criminoso patológico”.

Os anais das ciências estão cheios de equívocos de grandes pensadores. No período da “revolução cientifica”, séculos XVI e XVII, o saber científico centrava-se na filosofia mecânica. Nesta teoria, todo e qualquer fenômeno era explicado pelas leis do movimento dos corpos. Gene Callahan, economista e escritor americano, conta fatos bizarros da época. Para René Descartes, a atração magnética se dava pela emissão de minúsculas partículas em forma de parafusos que, ao “atravessarem os poros dos objetos de aço, puxavam-nos para o magneto”. Não menos esquisita era a tese de Thomas Hobbes para a formação do gelo: “um vento constante que age contra os líquidos, pressionando as partes de baixo contra as de cima, até coagular”. Richard S. Westfall, citado por Callahan, afirmava que o apego à filosofia mecânica atrasou em mais de um século o desenvolvimento das ciências ópticas, só para citar um caso (Scientism Standing in the Way of Science).

São fatos cômicos, se não fossem trágicos, no dizer de Einstein. Hoje se repetem no campo das ciências sociais ou humanas, principalmente no seu ramo mais desenvolvido, a Economia. No setor público gaúcho, por exemplo, os inúmeros projetos e agendas criados para modernizar e controlar seus gastos, redundam sempre em fracassos, devido ao uso de métodos cativos das ciências físicas, inadequados numa área de trabalho humana. Ludwig Von Mises ensina que “a Economia não é uma ciência experimental e empírica”, como é o caso das ciências naturais. Nela prevalece a ação do homem, que faz escolhas, que age, reage e se omite buscando melhorar de vida. O uso da razão e dos instintos gira em função dos custos e benefícios esperados pelos agentes. Mises chamou esses estudos de Praxeologia, ciência ou teoria geral da ação humana, válida universalmente, em qualquer tempo, local e cultura (Ação Humana).

Pelos estudos praxeológicos, pode-se concluir que os projetos calcados em padrões estatísticos ou mecânicos são inócuos para controlar os gastos dos governos: não contemplam a ação do homem para sair de uma situação menos satisfatória, para outra mais satisfatória. E sem o vínculo de um sistema de estímulos humanos, vamos continuar “lutando inutilmente contra os galhos”...

ZERO HORA 26 de agosto de 2010 *Economista